Nem por um instante duvido que a agência que fez a campanha portuguesa do Mitsubishi ASX já canta vitória e vai, se o não fez já, impressionar o cliente com os "resultados". Desde que falem de nós, não há má publicidade.
Mas a campanha é também uma prova da ignorância com que pessoas do meio da publicidade continuam a movimentar-se na rede. Isto quando passamos o ano de 2010, quase duas décadas passadas sobre a invenção da World Wide Web.
Quando vi o outdoor pela primeira vez -- um sorvedouro de gasolina pintado de azul com um
facebookiano botão "+1 Add as Friend" -- sorri. Apostei logo ali, na Segunda Circular, que vinha aí borrasca. É quase uma regra, isto de os publicitários se verem compelidos a imitar o que é criado no âmbito da cultura popular, levando os sinais para dentro dos anúncios. Quase sempre o resultado final é do género mais-valia-estarem-quietos.
Claro que este meu pensamento é o que os publicitários classificarão de arrogância elitista. Os "números", dizem eles, legitimam a sua afirmação.
Quem sou eu para os contrariar.
Acontece apenas que tenho uma opinião sobre os autores desta campanha. Não é uma opinião lisonjeira. Eu até admito como válida a ideia de aproveitar a onda popular de reconhecimento pictórico do botão do Facebook, sobretudo -- e isto é importante -- entre as pessoas que são o alvo do anúncio. Daí em frente, está tudo errado.
Não vou tão longe como o Fernando Fonseca no título
O Mitsubishi ASX no Facebook ou como ser estúpido que nem uma porta, Fernando que ainda por cima, há semanas, tinha escrito um artigo cuja leitura é altamente recomendável a todos os publicitários:
Como as marcas andam a invadir a nossa privacidade no Facebook. Nem posso ser tão detalhado como o Bruno Ribeiro, que explica tudo muito bem explicadinho neste artigo,
Mitsubishi Gasta Dinheiro Para Mostrar que Não Percebe o Facebook.
Sintetizo os principais argumentos antes de finalizar:
- O Facebook tem um enquadramento próprio para as promoções: chama-se "página". A campanha ignorou os termos de utilização do Facebook e, pior, as suas práticas comuns;
- O Mitsubishi ASX tem um perfil no Facebook como se fosse uma pessoa, o que é:
- contra as regras do Facebook;
- desrespeitoso para com as pessoas que têm perfis no Facebook;
- insultuoso para quem aprecia as diferenças, favoráveis ao consumidor, do ambiente da rede face ao ambiente dos media antigos;
- Usar um perfil implica obrigar o interessado no carro a uma acção aberrante: amigar-se com um veículo para obter mais informação sobre ele. A forma correta está no botão ao lado: criar uma página da qual as pessoas possam, ou não, gostar, mas na qual podem consultar livremente toda a informação.
Para ficar bem na fotografia do cartaz e dar um toque de modernaço ao SUV, a agência sacrificou a relação com a web, o ambiente reticular e as suas regras de funcionamento. Se a ideia era reduzir o cartaz --propaganda de massas como nenhuma outra -- a um link (errado, ainda por cima, como se vê na foto acima) para um site onde a comunicação é errada, como comprova o reduzido número de "amigos" (média de 120 por dia na última semana), menos sentido faz.
Se não foi ignorância, foi o quê?
Termino com o website do
novo ASX. Parto do piedoso princípio que a agência pediu autorização ao Facebook para copiar o design. Dito isto, a colagem gráfica ao Facebook pode parecer muito criativa no primeiro olhar mas ao segundo revela-se precisamente o contrário. É uma cópia desinspirada e sem sentido e, em última análise, cria uma camada de ruído que não ajuda a perspectivarmos o veículo enquanto tal.